Dos 15 cães que moram na casa do Plácido, 14 às vezes latem um pouco, na definição do professor e da sua mãe, Dona Wanda. Mas segundo eles não é o tempo todo. Latem para o lixeiro, como todo bom cachorro, mas também latem para os funcionários que medem a água e a luz. Latem também para o carteiro e inclusive comem algumas correspondências. 

Foto: Blog 
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Os cães do Plácido têm o péssimo hábito de latir para os gatos que andam sobre o muro e o telhado e por extensão latem para os passarinhos que pousam nos fios elétricos. Se alguém tocar a campainha ou bater palmas, eles latem para avisar. Se passar bicicleta ou moto na rua também. Basicamente só latem nestes momentos. Fora isso quando venta forte, quando tem trovão, quando faz muito calor ou muito frio, quando passa avião, caminhão ou cachorro na porta de casa. Também não gostam do apito do vigia no meio da madrugada, nem sirene de ambulância. Quando as crianças jogam bola na rua e quando escutam o estouro de fogos de artifício, aí eles latem mesmo, com vontade. Fora estes momentos, eles são bem silenciosos.
A casa do Plácido fica em uma rua bem erma, sem saída, de um lado tem um terreno baldio, mas do outro tem a casa do Sr. Mauro, que andava reclamando da “latição”. Depois de alguns bate bocas entre a família do Sr. Mauro e a família do professor, o vizinho acabou por entrar na justiça, pedindo a retirada dos cães, alegando excesso de barulho. O juiz lhe deu razão, e agora Plácido tinha 24h para retirar os cães, sob pena de serem recolhidos ao canil municipal.
- Senhor Mauro, veja bem, tenho estes cães há vários anos, todos recolhidos da rua.
- Seu Plácido, eu não quero nem saber. Desde que mudei para cá nunca tive sossego. Seus cachorros latem o dia inteiro e a noite inteira também. Sabe, Seu Plácido, estou bem de vida, minha casa era para ser o paraíso. Tenho TV de plasma, Seu Plácido, eu tenho home theather, tenho aparelho de som, cafeteira expressa, tenho até um chess long, sabe o que é isso? Coisa de gente fina. Seu Plácido, na minha casa eu tenho de tudo, menos uma coisa, sabe o que? Sossego. Silêncio. Porque seus cachorros não deixam, e a sua mãe também, que conversa alto com eles o tempo todo. Tomara que a justiça leve todos eles embora mesmo.
Plácido, agoniado com a possibilidade de perder os cães foi se aconselhar com a Deinha, sua amiga e camarada de proteção animal.
- Deinha, vou ter que tirá-los daqui mesmo, nem que seja por alguns dias, até o assunto esfriar. Ou os levo para a clínica da Dra. Flávia, ou para a casa do Cidão, que ofereceu ajuda.
- Pelo amor de Deus, seu Plácido, não leva para o Cidão não, que ele não é do bem. Ele vai jogar o seu problema na internet, pedir dinheiro e usar para outra coisa. Lembra do caso daquele cachorrinho que ele resgatou 18 vezes? Sempre o mesmo cachorro? Às vezes amarrado na árvore, às vezes dentro do bueiro. O coitado até abanava o rabinho quando ele chegava para fotografar o resgate e pedir dinheiro.
- É mesmo, então vamos para a clínica. Vou precisar pedir dinheiro emprestado para minha mãe, pois meu salário acabou no dia seguinte ao pagamento. Quando eu receber meu 13º salário eu pago a ela.
- Tá certo, eu te ajudo no transporte, mas deixe pelo menos o Bimbo, pois ele é velho, surdo e mudo. Dorme o dia inteiro e não vai incomodar o “mala” do Sr. Mauro.
E assim naquele final de semana a rua do Plácido ficou tranquila. Os cães no hotel da clínica e Plácido junto, pois não abriu mão de passar a noite com eles. Dona Wanda teve uma crise de pressão alta, por conta da situação e foi internada, para dormir no hospital até melhorar. Deinha foi escalada para dormir na residência do professor e junto com o Bimbo tomar conta da casa.
E o Sr Mauro, ficou tão feliz com o silêncio, que levou a família toda para jantar fora e comemorar até tarde.

E foi justamente no silêncio da noite, com Deinha e Bimbo roncando alto juntos, que estacionou uma Kombi branca na porta do Sr. Mauro, 5 homens vestidos de preto e com capuz na cabeça entraram na casa e carregaram tudo que puderam para dentro do carro e partiram sem deixar pistas. Para não dizer que carregaram tudo, deixaram um carnê das Casas Bahia, com 48 prestações, dos móveis e eletrodomésticos que o Sr. Mauro havia comprado.


Foto: Portal Sananduva
No dia seguinte ainda abalado, o vizinho furtado procurou o professor e disse:
- Olha Seu Plácido, roubaram a minha casa e levaram tudo. E não tinha nem um cachorro seu para dar o alarme. Vou comprar tudo novo de novo e mais para a frente vou me mudar daqui. Por enquanto quero dizer que vou retirar o processo e o senhor pode trazer os cachorros de volta. Ruim com eles e pior ainda sem eles.
E partiu cabisbaixo para dentro de casa.
Plácido lamentou o desfalque do vizinho, mas sem perder tempo, correu para a clínica e trouxe a turma do barulho toda de volta.

 Veterinário Wilson Grassi