Posted: 21 Jan 2013 10:19 AM PST
CONDUTA ANTE MAUS-TRATOS
Invadir um domicílio para socorrer animais é legal?
Foto: s/c
O
direito que nos assiste quando expressamos o nosso inconformismo com o
crime é o mesmo que se transforma em dever da autoridade pública em
averiguá-lo, pois o cidadão espera dos órgãos de governo a proteção
necessária contra o crime e a violência.
Muitas
pessoas já sentiram tristeza e indignação quando ouviram o cão do
vizinho uivando ou latindo, ou o miado do gato abandonado, expressando
solidão, fome, angústia, dor e desespero pelas crueldades sofridas.
No
último final de ano, um gato preso entre a janela e a rede de proteção
de um apartamento no 15º andar do Edifício Paquita, em Higienópolis,
região central da capital paulista, sem água e sem comida, chamou a
atenção da mídia e ganhou destaque nos principais jornais e grandes
portais de Internet. A foto do gato foi publicada, pela primeira vez, no
início da tarde do dia 1° de janeiro, pelo
estadao.com.br. Foram feitos pedidos de socorro ao Corpo de Bombeiros e à Polícia Militar, sem êxito.
Foto: s/c
O
síndico do prédio, sabendo que os responsáves pelo gato abandonado
viajaram para o Rio de Janeiro, sentiu-se na obrigação de invadir o
asilo inviolável para prestar socorro ao animal. As pessoas que se
preocupam com o bem-estar dos animais sentiram-se vitoriosas.
A
Constituição Brasileira declara, no seu artigo 5º, XI, que “a casa é
asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem
consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre,
ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.
Nada
existe no nosso ordenamento jurídico que nos leve a entender que esta
norma tenha por destino a prestação de socorro, exclusivamente, ao
animal humano. Não tem fundamento e é arbitrária qualquer restrição ao
texto constitucional, pois o próprio artigo 225, §1º, inciso VII, afirma
incumbir ao Poder Público a vedação das práticas que submetam os
animais à crueldade.
“Todos
têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações” e que “para assegurar a efetividade desse
direito, incumbe ao Poder Público proteger a fauna e a flora, vedadas,
na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica,
provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade”.
Deixar
um animal sem água e sem comida, preso entre a janela e a rede de
proteção de um apartamento, durante vários dias, é submetê-lo à
crueldade, é condená-lo à morte, é crime. De que maneira poderá o Poder
Público, em obediência à Constituição, proteger este animal ou vedar a
submissão dele à crueldade ou à morte sem socorrê-lo? É dever do Poder
Público, fazendo uso de uma das exceções constitucionais ao princípio da
inviolabilidade do domicílio, prestar socorro imediato ao animal.
Devemos
lembrar, ainda, que o Código Penal, em seu artigo 150, §3º, inciso II,
afirma “não constituir crime a entrada ou permanência em casa alheia ou
em suas dependências, a qualquer hora do dia ou da noite, quando algum
crime está sendo ali praticado ou na iminência de o ser”.
Algumas
providências acautelatórias devem ser tomadas para que não venha a ser
configurada a violação de domicílio. Em companhia de duas testemunhas,
abra a porta da casa com um chaveiro e, depois da prestação do socorro,
feche-a. No próprio local, lavre um termo descrevendo as condições em
que se encontrava o animal, assine e colha as demais assinaturas.
Comunique
o ocorrido na circunscrição policial e leve o animal para ser atendido e
examinado numa clínica veterinária. “Manter-se inerte diante de um ato
de maus-tratos é conduta moralmente censurável, que só faz crescer a
audácia do malfeitor”, conforme nos faz lembrar o brilhante Promotor de
Justiça de São José dos Campos – São Paulo, Laerte Fernando Levai, em
sua obra Direito dos Animais.
Antonio Carlos Fernandes - Advogado, economista e pós-graduando em psicopedagogia social.